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Ponto | Dos Grilhões ao Palco

Publicado em: 06/03/2012 |

Após o processo de abolição da escravatura no continente americano, no século 19, muitos escravos negros já libertos retornam às suas cidades africanas de origem e, influenciados por culturas diferentes, em razão de sua passagem pelas Américas, levam consigo conhecimentos artísticos que influenciariam, de modo único, a história do teatro nessas localidades.

 

Foi nessa época que o brasileiro Z. P. Silva, que morava em Lagos, Nigéria, junto com alguns atores locais (todos ex-escravos) fundam a Brazilian Dramatic Company (Companhia Dramática Brasileira), o primeiro elenco regular da cidade. O grupo foi pioneiro ao levar para o seu país o teatro nos moldes europeus, misturado com elementos da cultura local, proporcionando uma expansão das artes cênicas nas regiões africanas.

 

Com vários autores da região despontando, entre eles Oyekan Owomoyela, peças como “Folklore and Yoruba Theatre” começam a se destacar na programação cultural de Lagos. Logo, sua fama se espalha entre autoridades distritais e, em 23 de maio de 1882, a cidade recebe a presença da rainha Vitória, do Reino Unido. Henrich Bey, cônsul alemão que estava na cidade, decide patrocinar representações da Brazilian Dramatic Company em homenagem à soberana, que incluíam peças humorísticas e dramáticas, além de execuções de violino e violão.

 

Existem, ainda, evidências de uma representação dramática em homenagem ao aniversário de D. Pedro II, então Imperador do Brasil. O evento, animado pela música de uma orquestra e contando com numerosos assistentes, teria acontecido na noite de 2 de dezembro de 1880, no Phoenix Hall. O jornal Lagos Times – periódico que circula até hoje – foi o responsável pela cobertura da cerimônia.

 

Depois do sobressalto causado na região por estas apresentações de gala, o grupo continuou, durante quatro décadas, encenando uma grande variedade de espetáculos. Porém, passados cerca de quarenta anos, perdeu o fôlego e acabou encerrando suas atividades. 

 

O pesquisador Fredric M. Litto, norte-americano radicado no Brasil, escreve em seu livro “Some Notes on Brazil’s Black Theatre”, de 1973: “Alguns dos membros desta sociedade dramática negra, de nomes adquiridos no Brasil, como da Costa, Campos, Barboza e Silva, deveriam tornar-se figuras de destaque nos meios artísticos do país. Infelizmente, o movimento de ‘concertos’ não durou mais de algumas décadas, pois lhe faltavam raízes fortes e independentes no solo nigeriano”.

 

Parte desta história ainda se materializa com a expansão do teatro folclórico brasileiro na África. Assim, bumba-meu-boi, burrinha e outras lendas passaram a percorrer regularmente as ruas de Lagos, lembrando o forte vínculo teatral estabelecido entre Brasil e África.

 

 

Texto: Victor Serrano / Felipe Del

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