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‘Plataformas digitais estão permitindo certa sanidade mental’, diz Rodolfo García Vázquez

Publicado em: 26/04/2020 |

POR MIGUEL ARCANJO PRADO

Rodolfo García Vázquez, diretor teatral fundador da Cia. de Teatro Os Satyros ao lado do ator Ivam Cabral e coordenador do curso de Direção da SP Escola de Teatro, está com a cabeça fervilhando de ideias e análises neste momento de pandemia e quarentena por conta do novo coronavírus.

Diariamente em seu Instagram @rodolfovazquez, o artista — que é formado em Ciências Sociais pela USP, onde atualmente cursa o doutorado na Escola de Comunicações e Artes — faz análises sobre os principais fatos e desdobramentos que o coronavírus tem provocado na sociedade brasileira e global, com atenção especial ao campo artístico.

Nesta entrevista, Vázquez expõe seus pensamentos sobre o atual momento já histórico da humanidade.  

Miguel Arcanjo Prado – Por que você decidiu fazer lives analisando o momento que vivemos; é o cientista social que pede licença ao diretor?
Rodofo García Vázquez – É um momento histórico novo para a humanidade, com consequências ainda imprevisíveis. Nós estamos há mais de um mês em quarentena e não sabemos por quanto tempo ainda viveremos com o temor da covid-19. Mesmo em países que passaram por essa pandemia há mais tempo, como a China, as coisas ainda permanecem em regime de exceção e controle, muito mais do que sempre foram por lá. E pela primeira vez na história, a humanidade, em sua condição ciborgue, passa por uma grave crise sanitária. Eu senti urgência agora, no começo desse fenômeno, de fazer registros e reflexões para as quais eu pudesse olhar no futuro. Ao mesmo tempo, tenho um lado de cientista social que sempre me pede para olhar as dinâmicas do mundo e tentar compreendê-las. Fiz Ciências Sociais na USP e esse olhar sobre a sociedade sempre fez parte do meu trabalho como artista. Não consigo pensar o teatro longe da vida que observo. Faço essas reflexões nas lives para mim mesmo e também para as pessoas que tem curiosidade sobre as coisas que elaboro e que, muitas vezes, contribuem com reflexões poderosas. Elas me ajudam ainda mais a profundar meu olhar.

Miguel Arcanjo Prado – O que você tem tirado de letra neste período?
Rodolfo García Vázquez – O que eu tenho tirado de letra é a capacidade que todos temos de nos reinventar. A tecnologia está permitindo coisas que eu jamais imaginei poder experimentar. Tenho trabalhado muito, muito mesmo. Feito pesquisas para quando o teatro puder voltar a existir fisicamente. Dado aulas. Feito inúmeras reuniões de trabalho, no país e no exterior. Nosso espírito de artista não está hibernando. Ele continua vivo e forte, ainda mais num momento como este. E isto me enche de esperança.

Miguel Arcanjo Prado – Você falou em uma live que é da geração analógica que precisou embarcar no virtual. Agora, o mundo todo é forçado a fazer isso para continuar tendo algum tipo de contato com outras pessoas. Você é da opinião que o coronavírus vai acelerar a revolução digital-tecnológica? Por quê?
Rodolfo García Vázquez – O coronavírus obrigou a humanidade a mergulhar no potencial dos aparatos tecnológicos que temos disponíveis. Entendemos agora que muito do que fazemos pode ocorrer virtualmente. Quando o planeta voltar a ter uma vida presencial, vamos saber dosar o que pode ser feito presencialmente e digitalmente. O trabalho remoto se expandirá, as conexões globais serão muito mais rápidas, a telemedicina se popularizará, a tele-educação também. A intimidade com a tecnologia naturalizará um novo universo de possibilidades.

O coordenador de Direção da SP Escola de Teatro, Rodolfo García Vázquez. Foto: Divlgação

Miguel Arcanjo Prado – Quais ações você destacaria como positivas neste momento no campo das artes?
Rodofo García Vázquez – Acredito que as lives de artistas são importantes. Fundamentais. Estamos aqui! Precisamos nos expressar e esse é o canal que podemos usar agora, então vejam o que estamos realizando! Vocês são nossos convidados. A cultura e a arte têm tido um papel essencial na quarentena. É uma pena que não se fale muito sobre isso. O que seria desse isolamento social se as pessoas não pudessem assistir a filmes, séries de TV, novelas, shows musicais? Sem ouvir música nos seus aplicativos? Ou visitar os museus virtuais? As plataformas digitais estão permitindo que as pessoas mantenham uma certa sanidade mental com uma vida cultural intensa dentro de casa. Enquanto isso, no mundo corpóreo, os artistas estão todos sem fonte de renda. E o Ministério da Cultura, agora Secretaria Nacional da Cultura, nem se manifesta sobre como viabilizar a sobrevivência dos artistas, técnicos e todos os envolvidos do setor cultural. 

Miguel Arcanjo Prado – O teatro vive hoje uma das mais graves crises que já passou. Você acha que o teatro vai sobreviver à pandemia? Como?
Rodofo García Vázquez – A crise do teatro hoje me lembra outras crises, como a da Primeira Guerra Mundial e da Segunda Guerra Mundial, onde os teatros praticamente foram engolidos pelas bombas e invasões. Diziam que o teatro havia morrido. Mas após essas duas tragédias, o teatro renasceu, se redesenhou, assumiu novas formas estéticas e criou revoluções artísticas. Eu tenho certeza que, quando essa quarentena acabar, as pessoas vão querer loucamente a presença física dos atores diante delas. O público vai querer ver o suor dos artistas ao vivo. Vai ser quase como que instintivo ver a arte em um corpo. E isso é o teatro. As artes do corpo vão ser fundamentais para recuperar nossa dimensão atávica, o que nos caracteriza como humanidade, o ritual.

Miguel Arcanjo Prado – Você, ao lado do Ivam Cabral, tem se movimentado muito nesta quarentena não só para manter a SP Escola de Teatro em pleno funcionamento como também para ajudar pessoas mais frágeis e vulneráveis socialmente, sobretudo do meio teatral, como na campanha #TeatroEAfeto, que arrecada cestas básicas. Por que vocês fazem isso?
Rodofo García Vázquez – Não fazemos nada mais do que nossa obrigação. Somos parte de uma comunidade que vem sendo muito atingida e é nosso dever dedicar nossos esforços durante a pandemia a nossos amigos. Tenho muitos relatos de artistas que já estão passando fome. Não tem o que comer em casa! Isso com apenas um mês de pandemia! Imaginem o que vai ser nos próximos meses? A classe artística está completamente desamparada pelo governo federal. O Estado e a Prefeitura de São Paulo estão organizando ações que pretendem mitigar o problema. Mas a situação é catastrófica e só tende a piorar com o tempo. Meus avós fugiram da Espanha depois da Guerra Civil e passei minha infância ouvindo eles dizerem: a fome piora muito depois que a Guerra acaba.


Leia a entrevista completa no Blog do Arcanjo

 

CULTURA EM CASA

Assim como outros equipamentos, a SP Escola de Teatro criou uma programação especial na internet para oferecer ao seus seguidores. Assim, está disponível uma série de conteúdos multimídia, como vídeos de espetáculos e de palestras e bate-papos de nomes como as atrizes Fernanda Montenegro, Nathalia Timberg e Denise Fraga, a monja Coen, a escritora Adélia Prado e o pastor Henrique Vieira, além de cursos gratuitos a distância.

O acervo ainda inclui filmes produzidos pela Escola Livre de Audiovisual (ELA) – iniciativa da Associação dos Artistas Amigos da Praça (Adaap), gestora da SP Escola de Teatro – em parceria com instituições internacionais, com a Universidade das Artes de Estocolmo (Suécia).

#culturaemcasa #teatroemcasa #entrevista



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