Durante todo o mês de outubro, dois aprendizes da SP Escola de Teatro foram enviados à Colômbia para participar de um intercâmbio. Cezar Renzi foi um deles. O estudante conta como foi a experiência no exterior.
Por José Cezar Pinheiro Renzi
“As minhas expectativas antes da partida eram as melhores, embora sempre com aquele receio de quando vamos ao encontro do que é novo, diferente. Claro que estava ansioso e apreensivo, um pouco com medo, mas no fundo sabia que seria incrível. Como foi, uma experiência mágica! Já havia estado em Bogotá antes da experiência do intercâmbio, fiz algumas apresentações com o grupo que trabalho no Festival Latino Americano de Teatro de Bogotá no ano de 2014. Tudo que esperava era o que tinha recebido de bom lá, ou seja, uma ótima recepção das pessoas, boa comida e muito teatro. E não me surpreendi, tudo se fez verdade e ainda melhor.
A chegada foi surpreendente. Logo de cara já fomos recepcionados por pessoas que depois, ao longo do período do intercâmbio, seriam nossos grandes amigos: um professor do curso de direção e uma atriz que trabalhava na área administrativa. Foram as pessoas que nos ensinariam a comer como um bogotano, que nos levariam a assistir as primeiras peças de teatro, que nos mostraria como ser parte daquela cidade. Já ficamos amigos ali.
As primeiras impressões são sempre um misto de estranhamento e curiosidade. Tudo parecia estranhamente lindo e esquisito ao mesmo tempo, mas ao longo dos dias foi se tornando parte real da vida. A comida que nunca tínhamos visto, o sistema de transporte copiado de Curitiba, as ruas com números em vez de nomes, e obviamente o espanhol. Muitas risadas com toda a confusão e dificuldade de estar em contato com uma nova cultura.
Cenário de “Rebú”
A relação interpessoal foi umas das coisas que mais me surpreenderam, foi o que me deixou seguro e aliviado para me inserir ao novo contexto. Os bogotanos são especiais pra mim por isso. Fui muito bem recebido, com muito carinho e paciência, principalmente com o pouco de espanhol que tinha no início. E não só no círculo da faculdade mas com a população em geral.
Dentro das atividades acadêmicas, participei ativamente do II Encuentro Latino-americano de Investigadores sobre el Cuerpo y Corporalidades en las Culturas, que ocorreu de 3 a 8 de outubro na Facultad de Artes ASAB, com palestras, oficinas e performances de proponentes de vários países da américa latina (incluindo, claro, o Brasil). Ajudei na pré-produção do evento, como produtor e na montagem do palco principal. Também pude participar de algumas oficinas, como a “Tapioca Performática”, do colombiano Iván Alexandro Ávils, e assistir às performances e os shows de músicas (algumas típicas colombianas, outras latino-americanas). Participei do X Encuentro de Escuelas de Teatro: El oficio del director, de 13 a 16 de outubro, na oficina da Maestra Elizabeth Vargas (diretora da companhia Teatro Dekarne, Sonora – Mexico). E também das atividades da faculdade, como as aulas do Maestro José Assad e Juan Manuel Cambariza e as aulas integrais (apresentações das pesquisas cênicas dos estudantes).
Fora dos eventos acadêmicos, ajudei na criação e montagem da cenografia do grupo Teatro del Embuste que estreou uma peça nova durante minha estadia lá, que se chama “Rebú” (do dramaturgo brasileiro Jô Bilac), no teatro Espaço Odeon. O grupo Teatro del Embuste foi fundado em 2014 por um coletivo de criação cênica formado por artistas de diversas trajetórias como Alberto Valdiri, Matias Maldonado e Danilo Canguçu, partindo de dramaturgias próprias e de adaptação de textos latino-americanos, buscando um teatro que envolva intensamente o espectador em todos os seus sentidos, não só para diverti-lo, mas para também movê-lo da posição de espectador passivo.
E dentro de uma perspectiva cultural e antropológica, vivi intensamente a cultura colombiana, conhecendo locais que são marcos na cidade (bairro da Candelária, plaza Simón Bolívar, Monserrate), experimentando comidas típicas (changua, tamal, ahiaco, patacones), e como não podia faltar, conhecendo os teatros mais importantes e algumas produções locais (“Hoy Envejecí Diez Años”, escrita e dirigida por Jorge Hugo Marín no Teatro Colón; “Aforismos Intenpestivos” dos estudantes da ASAB, no Teatro Varasanta; “Los Incontados: Un Triptico”, no Mapa Teatro; entre outras).
Agora de volta ao Brasil consigo ver o quanto foi engrandecedor toda essa experiência. Não só no âmbito mais pessoal mas como um profissional. O contato com o estranho é sempre muito rico num plano mais interno, nos livramos dos preconceitos e aceitamos o diferente, mas o que me chamou a atenção foi toda a experiência de teatro que tive no tempo em Bogotá. A experiência com o Teatro del Embuste me mostrou um pouco o sistema de trabalho técnico colombiano, o encontro de escolas, como trabalham os grupos e os diretores, a faculdade o pensamento estético e filosófico do teatro de lá. Pude acompanhar a rotina do mundo do teatro numa cultura diferente da minha. Nada podia ser mais encantador e rico. E claro, como não podia deixar de lado, o ponto alto da viagem, toda a experiência com a língua espanhola. Que agora domino e com a qual consigo me expressar (não completamente como minha língua nativa, mas de outra forma mais sensível e diferente)
Gostaria também de destacar o que menos e mais gostei. É complicado resumir assim, em poucas palavras, tudo que se revolucionou na minha pessoa. A pior parte pra mim foi a acomodação. Viver 30 dias em uma mala num quarto de hotel é estranho, mas foi tudo parte do aprendizado. Toda experiência é válida! Amei e desgostei de muita coisa, como haveria de ser, mas o que chamou muito minha atenção foi a receptividade do povo bogotano, as formas que fui recebido em todos os lugares. Foi impressionante o carinho de todos, o tratamento que recebi. E as amizades que criei e as saudades que carrego comigo e deixei por lá.”
