Ele já esteve na SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco, quando conheceu o projeto recém-nascido da Instituição. Ontem (15), quase dois anos depois, retorna ao mesmo solo para falar com os aprendizes. Seu nome é Eugenio Barba, um dos diretores teatrais mais consagrados do mundo, que marcou presença na semana de seminários Diálogos da SP.
Acompanhado da atriz Julia Varley, que também faz parte do Odin Teatret – grupo fundado por Barba em 1964 –, o italiano ministrou a aula magna “Aprendendo a Aprender”, abordando temas que variam entre o seu coletivo, antropologia teatral, o ofício do diretor, entre outros.
No início, após ser introduzido pelo coordenador pedagógico Joaquim Gama, Barba rejeitou o microfone e pediu que todos se aproximassem, criando um ambiente mais informal e descontraído. Então, discorreu sobre a importância da escola na formação de artistas de teatro. Segundo ele, os professores devem ser exigentes e rígidos e devem, ainda, estimular, sempre, os aprendizes a se desenvolverem, até que realizem trabalhos excelentes por si mesmos. “A escola são os estudantes; são eles quem decidem o que a escola é.”
Para Barba, existem duas formas de pensar o aprendizado: como gatos e como macacos. Os filhotes de gato têm, desde os primeiros dias de vida, uma superproteção da parte materna. Esse cuidado excessivo faz com que o gato perca em autonomia. Já a mãe dos macacos, obriga que seus filhotes se agarrem nela durante os passeios. Dessa forma, criam uma resistência maior e aprendem como se adaptar a situações adversas.
Sobre o fazer teatral, o convidado observou que “pensar é fazer e fazer é pensar. Não é o método que conta, mas o professor que ensina. É ele quem tem a capacidade de transformar os conceitos já existentes e fazer crescer o pensamento dos seus alunos.”
A influência dos “artistas estrangeiros do passado” foi um dos conceitos que permearam a aula magna. Estes seriam os antigos artistas, pesquisadores e teóricos que nasceram antes de nosso tempo, que foram responsáveis por moldar diversos modelos de se pensar no fazer teatral. Do confronto desses pensamentos com os do atual criador – que deve “encontrar um país estrangeiro em seu corpo”, para assim redescobrir sua própria vida – é que nascem as novas proposições.
“O que costumamos chamar de espontaneidade é nossa missão. Podemos utilizá-la no dia-a-dia, mas na ação teatral é preciso ser eficaz o suficiente para atingir cada um dos espectadores. O aprendizado para isso consiste em afastar o seu ser social para construir um corpo estrangeiro”, observa.
Ao adentrar um novo assunto, mais voltado ao trabalho dos atores, Barba afirmou que toda habilidade teatral tem início com a prática corporal e, em seguida, chamou, ao palco improvisado, sua acompanhante Julia, que fez algumas demonstrações de exercícios corporais e, também, expressões faciais.
Enquanto a atriz se movimentava, o diretor ia explicando o sentido dos gestos. “Reparem que o corpo dela é constituído de diferentes mutações; é como um relógio biológico. O objetivo é estabelecer uma relação física com o público de maneira que a presença do ator aja sobre o sistema nervoso até do espectador que se encontra mais distante.”
Julia Varley demonstrando seus exercícios (Foto: Arquivo SP Escola de Teatro)
Repetindo pequenos padrões e reencontrando, assim, a “ação natural”, Julia descreve a técnica empregada. “Quando faço esse exercício, tento não pensar. Neste momento, não tenho certeza do que estou fazendo, apenas sinto que preciso mudar de tensões e posições.”
Na sequência, a atriz mostrou sua versatilidade ao recitar uma frase de Shakespeare em diferentes entonações, explicitando a forma como cada uma delas chegaria ao público: ecoando sobre suas cabeças, rastejando, cercando, envolvendo e até acarinhando os espectadores.
O Odin Teatret também foi lembrado pelo convidado, que relatou um pouco da dificuldade no início dos trabalhos do grupo, quando começaram, ainda de maneira autodidata, a desenvolver, por meio de experimentações, um sistema como a proposta destes exercícios.
Durante o debate, as questões englobaram tópicos como a relação do corpo do ator com o espaço; a razão pela qual as pessoas ainda se interessam pelo teatro; a importância da dramaturgia; a relação do diretor com o dramaturgo; e o constante estado de investigação interpretativa de Julia.
Para finalizar, Barba reforçou a importância da escola. “É necessário formar estudantes criativos, com capacidade de se adaptar, e, ao mesmo tempo, estimular a paixão e motivar a luta contra os critérios e normas implacáveis que gerem nossa profissão, para que, no final, eles possam dizer: ‘eu sou meu criador’. Boa sorte a todos vocês.”
Na despedida, o coordenador pedagógico agradeceu aos convidados e ressaltou: “O Eugenio esteve aqui, no ano passado, quando a Escola ainda era um bebê rescém-nascido. Agora, este bebê está um pouco mais robusto, mas a possibilidade de troca ainda é ímpar.”
Texto: Felipe Del