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Papo de Teatro com Sérgio Roveri

Publicado em: 04/10/2010 |

Sérgio Roveri nasceu em Jundiaí, SP, no dia 15 de setembro de 1960. É jornalista e dramaturgo.

 

Como surgiu o seu amor pelo teatro?
Foi algo que surgiu um pouco tarde na minha vida. Sempre gostei muito de cinema e literatura. Passei a compreender um pouco mais e a gostar de teatro quando me mudei para São Paulo, perto dos 30 anos. Coincidentemente, foi nesta época que comecei a trabalhar no caderno de cultura do Jornal da Tarde, onde me aproximei bastante do teatro.

 

Lembra da primeira peça que assistiu? Como foi?
Acho que a primeira não foi exatamente uma peça. Foi uma dramatização do programa Vila Sésamo, com a Sonia Braga e a Araci Balabanian. Elas se apresentaram em um grande ginásio de Esportes em Jundiaí, quando eu era menino. Foi a primeira vez que vi atores ao vivo. Até então, eu achava que eles existissem somente na televisão.

 

Qual foi a última montagem que você viu?
Foi “O Estranho Casal”, para conhecer o texto do Neil Simon. Confesso que não é o texto dele de que mais gosto.

 

Um espetáculo que mudou o seu modo de ver o teatro.
“Dona Doida”, texto da Adélia Prado, com a Fernanda Montenegro. Me mostrou que o teatro pode ser extremamente simples e emocionante.

 

Um espetáculo que mudou a sua vida.
Ainda estou à espera dele.

 

Você teve algum padrinho no teatro? Se sim, quem?
Eu diria que, modestamente, tive dois. O primeiro deles, não só padrinho, mas um amigo querido e eterno, foi o Alberto Guzik, que acompanhou minha trajetória desde o primeiro texto que escrevi. O segundo foi Paulo Autran, que dizia que eu tinha de parar com o jornalismo e me dedicar somente ao teatro. Ainda não consegui fazer isso.

 

Já saiu no meio de um espetáculo? Por quê?
Sim, mais do que uma vez. Porque era ruim demais, texto chato e atores completamente perdidos em cena. É uma pena quando isso acontece.

 

Teatro ou cinema? Por quê?
Os dois, sempre. Cada um deles me toca de maneira específica, particular. Há períodos em que gosto mais de cinema, até de filmes de ação, em que tudo é explodido. Outras vezes, fico só com o teatro, o prazer do texto e a proximidade do ator.

 

Cite um espetáculo do qual você gostaria de ter participado. E por quê?
Como ator, eu não gostaria de participar de nada, porque realmente está aí uma coisa que eu não sei fazer e acho que jamais conseguiria. Como dramaturgo, gostaria de ter participado do processo de criação da peça “Ensaio.Hamlet”, da Cia. dos Atores, pelo desafio de dissecar um dos textos mais conhecidos de Shakespeare e brincar com ele.

 

Já assistiu mais de uma vez a um mesmo espetáculo? E Por quê?
“Ensaio.Hamlet” eu vi três vezes. Foi o meu recorde. Sinceramente não gosto de rever um espetáculo, por mais que tenha me apaixonado por ele. Existe uma primeira impressão que eu sempre procuro preservar.

 

Qual dramaturgo brasileiro você mais gosta? E estrangeiro? Explique.
Aprecio o trabalho de muitos dramaturgos brasileiros contemporâneos, mas seria indelicado nomeá-los aqui, pois o risco de esquecer alguém é grande. Sendo assim, fico com os clássicos Nelson Rodrigues, Plínio Marcos, Dias Gomes e Jorge Andrade. A lista de estrangeiros é imensa: Shakespeare, Molière, Ibsen Tchecov, Harold Pinter, Beckett, Tennessee Williams, O’Neil e Arthur Miller. Estou encantado com os franceses Koltès, Lagarce e Michel Vinaver.

 

Qual companhia brasileira você mais admira?
Admiro várias, e por várias razões. Eu precisaria de muito espaço para explicar aqui, então vou apenas citar: Teatro da Vertigem, Cia. do Latão, Os Satyros, Cia. dos Atores, Grupo Galpão, Grupo Armazém, CPT, Oficina, Club Noir.

 

Existe um grupo ou companhia de teatro que  você acompanhe todos os trabalhos?
Tanto pelo lado profissional, pela pesquisa que eles desenvolvem e pelos amigos que possuo ali, eu acompanho muito de perto o trabalho de Os Satyros, do CPT e dos Fofos Encenam.

 

Qual gênero teatral você mais aprecia?
Embora eu não acredite mais na existência de um gênero puro, eu diria que é o drama. E, em alguns casos específicos, as experiências do teatro pós-dramático.

 

Em qual lugar da plateia você costuma sentar? Por quê? Qual o pior lugar em que você já sentou numa plateia?
Qualquer lugar onde eu possa ser exclusivamente plateia. Odeio a sensação de que eu serei chamado a participar do espetáculo, subir no palco ou responder perguntas do elenco. Por isso os espetáculos do Oficina ainda me deixam nervoso.

 

Fale sobre o melhor e o pior espaço teatral que você já foi ou já trabalhou?
É uma questão muito delicada, porque existem vários espaços simples e sem conforto que são responsáveis por alguns dos melhores espetáculos que já assisti – o que comprova que as instalações têm pouco a ver com o gênio artístico.

 

Já assistiu a alguma peça documentada em vídeo? O que acha do formato?
Já assisti a várias, mas acho que ainda não foi encontrada a fórmula, a maneira, ou a técnica, de manter no vídeo a emoção da peça ao vivo. Às vezes é o som que não é bom, em outras vezes é a captação da imagem. Assisto mais como pesquisa do que como prazer.

 

Existe peça ruim ou o encenador é que se equivocou?
Existe peça ruim, como existe filme ruim e livro ruim. Infelizmente, quando a gente está envolvido numa produção ruim, vai se dar conta disso um pouco tarde demais.

 

Como seria, onde se passaria e com quem seria o espetáculo dos seus sonhos?
Sinceramente eu nunca pensei nisso, nunca tive um espetáculo dos sonhos. Eu procuro ver minha carreira como experiências que vão se acumulando no sentido de aprimorar a minha escrita. Tenho a consciência de que não é um trajeto sempre em ascensão – muitas vezes a gente erra e tropeça no meio do caminho, o que faz com que determinada peça seja inferior a uma realizada anteriormente. Se eu tenho algum sonho nesta carreira é o de poder trabalhar sempre com bons atores e bons diretores.

 

Cite um cenário  surpreendente.
Não chega a ser exatamente um cenário, talvez uma solução cênica, a do espetáculo “Os Efêmeros”, do Théâtre Du Soleil.

 

Cite uma iluminação  surpreendente.
Pela dificuldade de execução, a do espetáculo “BR-3”, do Teatro da Vertigem.

 

Cite um ator que surpreendeu suas expectativas.
Paulo Vilhena na peça “Esta Nossa Juventude”.

 

O que não é teatro?
Tanta coisa que a gente vê por aí, lotando os teatros e sendo recomendada pela crítica teatral. Embora dizer isso seja deselegante e pretensioso.

 

Que texto você foi ler depois de ter assistido à sua encenação?
Rei Lear, de Shakespeare.

 

A ideia de que tudo é válido na arte cabe no teatro?
Penso que sim. Embora esta fase em que tudo é permitido tenha gerado alguns equívocos. Mas aprendemos com eles também.

 

Na era da tecnologia, qual é o futuro do teatro?
A mais conservadora das respostas: o ator e o texto

 

O teatro é uma ação política? Por quê?
A cada vez mais acredito que qualquer gesto pode ser um gesto político. Quando andamos dois quarteirões com um papel de bala na mão, à procura de um cesto de lixo, estamos sendo políticos e civilizados. Se uma atitude tão banal pode ser política, imagine o teatro, um espaço em que as ideias podem ser fomentadas noite após noite, na presença do público.

 

Quando a estética se destaca mais do que o texto e os atores?
Quando o artista esvazia o sentido da modernidade e quer ser contemporâneo – ou vanguarda – a qualquer custo. Difícil, hoje, é emocionar o seu próximo. Gritar pelado no palco ou desconstruir a dramaturgia de maneira gratuita é fácil. E é antigo também.

 

Qual encenação lhe vem à memória agora? Alguma cena específica?
Uma cena da peça “Réquiem”, em que um personagem conta para um cavalo que seu filho morreu.

 

Em sua biblioteca não podem faltar quais peças de teatro?
Eu acho que é essencial ter em casa ao menos algumas obras de autores fundamentais, como Shakespeare, Tchecov, Ibsen, Pinter, Beckett, Nelson Rodrigues, Brecht. Para a gente ler, pesquisar e se deliciar de vez em quando.

 

Cite um diretor (a), um autor (a) e um ator/atriz que você admira.
Para não comprometer ninguém: Antunes Filho, Tchecov, Fernanda Montenegro, respectivamente.

 

Qual o papel da sua vida?
Ainda estou escrevendo um pouco por dia, está longe de ficar pronto.

 

Uma pergunta para William Shakespeare, Nelson Rodrigues, Bertold Brecht ou algum outro autor ou personalidade teatral que você admire.
Para Shakespeare: Shakespeare, fala a verdade: você era um, vários nenhum ou todos nós?
Para Nelson Rodrigues: Você teria coragem de fazer terapia?
Para Brecht: O senhor conhece algum cabaré onde a gente possa ir para se sentir um pouco mais glamouroso na vida?

 

 O teatro está vivo?
Vivíssimo, respirando, falando, pensando e recebendo visitas. O que às vezes pode ser um problema.