Eduardo Estrela é ator
Como surgiu o seu amor pelo teatro?
Até meus 27 anos, morei na periferia da Zona Leste e sempre estudei em escola pública. Quando eu tinha 16, uma garota da escola, por quem eu estava apaixonado, e sem coragem de me declarar, me falou de teatro… Pior: eu a ouvi convidando um outro rapaz para ir ao teatro! Movido pela curiosidade e ciúme, fui ver o que era aquilo. Juntei meu dinheirinho, pedi um pouquinho mais para o meu pai e lá fui eu. Quase 30 minutos de caminhada e chego ao Teatro Martins Penna, na Penha, para assistir à comédia “Um Padre à Italiana”. Saí daquela sala escura exultante! Os 30 minutos de caminhada de volta voaram, tão ansioso que eu estava de contar para o meu pai – que nunca havia ido ao teatro! – o que tinha acontecido. Porque foi mais do que ver uma história legal: algo muito forte aconteceu! Foi tão forte quanto a primeira vez que trepei apaixonado; foi mais forte do que quando vi meu nome na lista de aprovados da Fuvest!
A partir dali, minha vida era juntar dinheiro para ir ao teatro. Fazia lista das peças que eu via. Assisti a espetáculos que foram primordiais para minha formação; sempre marinados pelos 30 minutos de caminhada: “Aurora da Minha Vida”; “Besame Mucho”, “Tá Boa, Santa?”… dinheirinho contado para o ingresso e para a condução; quando conseguia tomar um café, me sentia o cara mais “in” da terra!
Um espetáculo que mudou o seu modo de ver o teatro foi…
“Tempestade em Copo D’Água” com o grupo Ponkã. Até então, eu só tinha assistido a espetáculos realistas. Foi aí que eu entendi a versatilidade do teatro.
Um espetáculo que mudou a sua vida…
Foram vários! Para cada “vida” que eu tive houve um espetáculo importante. Alguns: “Aurora da Minha Vida”, “Besame Mucho”, “Tá Boa, Santa?”, “O Porco”, “Sonada Kreutzer”, “Paraíso Zona Norte”, “Luis Antônio Gabriela”…
Você teve algum padrinho no teatro? Se sim, quem?
Quem me pôs no Teatro foi a diretora Cíntia Alves. Devo a ela meus primeiros ensinamentos e o norte de estudo. Para além dela, três outros profissionais foram determinantes na minha carreira – e ainda me inspiram: Denise Weinberg, Guilherme Sant’Anna e Renata Melo.
Já saiu no meio de um espetáculo? Por quê?
Sim. Pelo óbvio: era muito ruim! Eu era mais jovem e, portanto, muito mais sincero. Hoje, com muito mais frequência, tenho vontade de sair, mas acabo ficando…
Teatro ou cinema? Por quê?
Essa pergunta é, para mim, completamente sem sentido! São duas experiências completamente diferentes e igualmente prazerosas – quando de boa qualidade! E digo isso tanto como expectador quanto como ator.
Cite um espetáculo do qual você gostaria de ter participado. E por quê?
De todos aqueles que me encantaram! Porque ator é que nem criança: se a brincadeira é boa, ele quer brincar!
Já assistiu mais de uma vez a um mesmo espetáculo? E por quê?
Várias vezes! Porque eram muito bons!
Qual dramaturgo brasileiro você mais admira? E estrangeiro?
Não tenho um autor de que eu goste em particular. Conheço pouco a dramaturgia brasileira – tirando Plínio Marcos e Nelson Rodrigues.Tenho preferência pelos dramaturgos americanos e britânicos. Em geral, eles produzem textos bem construídos, com boa carpintaria. Para mim, de nada vale uma boa ideia se ela não é trabalhada. Muito trabalhada! Gosto de textos sutis, que vão se revelando com delicadeza, à medida que avançam.
Qual companhia brasileira você mais admira?
Companhia dos Atores, do Rio de Janeiro.
Existe um artista ou grupo de teatro do qual você acompanhe todos os trabalhos?
Não. Vejo alguns trabalhos, depois me canso, me revolto, abandono… Depois volto…
Qual gênero teatral você mais aprecia?
O bem feito! Acho um “saco” este negócio de gênero! Eu vou ao teatro para ver uma boa história e bem contata. Se eu vou rir ou chorar isso é um problema meu e que tem a ver com a minha história de vida. O que faz um chorar, faz outro rir. Odeio ir ao teatro e ver um bando de gente – atores, diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador, músico – tentando me fazer rir ou chorar porque a peça é um “Drama” ou “Comédia”! Em geral, o que se tem é um amontoado de lugares-comuns.
Em qual lugar da plateia você gosta de sentar? Por quê?
Gosto de me sentar do meio para trás
Existe peça ruim ou o encenador é que se equivocou?
Claro que existe peça ruim! Um bom diretor não salva um texto ruim. No máximo, ele disfarça. Mas ainda assim suas fragilidades ficam evidentes. Agora, é óbvio que encenador também erra e estraga muito texto bom. Em resumo: é possível estragar um texto bom, mas não salvar um texto ruim.
O que não é teatro?
Toda história contada fora de um espaço cênico definido e/ou sem a presença da plateia.
A ideia de que tudo é válido na arte cabe no teatro?
Teatro é uma das diversas formas de manifestação artística e, como cada uma das outras, tem suas especificidades. O “poder tudo” rompe os limites do específico destruindo a forma de expressão artística, seja ela qual for. Precisamos tomar cuidado para não rompermos com o que dá especificidade ao teatro em busca da “liberdade criadora”. Um grande erro é pensarmos que a criação – na sua plenitude – se garante pelo não limite. O que nos faz sermos criativos é a superação de “limites”, sejam eles inerentes à própria manifestação artística – no caso do teatro, um palco, atores, direção e alguns elementos técnicos – ou conjunturais como falta de dinheiro suficiente para a produção, por exemplo. A liberdade total é o nada.
Na era da tecnologia, qual é o futuro do teatro?
Quanto mais tecnológica for a sociedade, mais encanto o teatro vai exercer sobre as pessoas! O problema que o teatro enfrenta hoje não tem a ver com tecnologia. O problema é de qualidade.
Em sua biblioteca, não podem faltar quais peças de teatro?
Não vou listar para não ficar deprimido. Já não tenho um monte delas!
Qual o papel da sua vida?
Aquele no qual estou trabalhando no momento. É assim que eu tento tratar todo trabalho para o qual sou convidado. Confesso que as personagens de textos clássicos me seduzem mais.
O teatro está vivo?
Claro que está! Não importa as bobagens que façamos, ele continuará.