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História versus forma

Publicado em: 05/08/2013 |

Gravura original do século 18, extraída do livro “The Moral and Comic Works of the Late Celebrated William Hogarth”, publicado em 1797 por Laurie and Whittle, Fleet Street, Londres


Por Mauricio Paroni de Castro*, especial para o portal da SP Escola de Teatro

Ser um ator, protagonista famoso, traz a glória e a certeza de viver, cotidianamente, nos mais profundos abismos de solidão ao atrair legiões de inimigos. Não tem saída, reza o lado obscuro da biografia dos grandes artistas da representação. Já que é assim, o negócio é escolher o tipo de inimigo; quanto mais talentoso, melhor.

O teatro também se constrói com inimizades. Uma das mais emblemáticas sempre foi alimentada entre atores “formalistas” e “realistas” – representantes de ideários de classe ou de tipo de cultura. Vale a pena lembrar uma das maiores rivalidades entre atores que o palco conheceu: David Garrick (1717-1779) versus James Quin (1693-1766).

Quin representava ao “velho” estilo: declamatório, carismático. Ele adaptava o texto às suas habilidades. Incendiava a plateia com seu carismático jeitão próximo das árias de ópera; usava o proscênio e abusava dele pela comunicação direta dos apartes precisos e oportunos que dramaturgos como Wicherley, Dryden e Ottaway escreviam.  Aumentava o seu brilho pessoal com a elegância e o luxo das roupas semelhantes às de sua plateia. Era mais ou menos como se o palco fosse um desfile de tendências da moda. Aliás, nem se sonhava, à época, em iluminar somente o palco para diferenciar-se da plateia, tarefa exclusiva da voz.

Foi o rival, Garrick, a empregar a distância entre o ambiente presente e o contexto da peça, com o fim de aproximar as duas realidades. Mais jovem, interpretava de maneira “natural”. Visitava cenas de delitos, hospitais, frequentava antros, pesquisava, criava atmosferas – por quanto os recursos disponíveis  lhe permitissem. Cada sua apresentação trazia uma novidade. Na campanha de reconstrução após o incêndio do Teatro Drury Lane, os dois representaram Shakespeare juntos no palco do  Covent Garden; Garrick conseguiu que o palco do novo teatro não tivesse o arco do proscênio, para tudo ser representado, com vestidos históricos atrás da linha da boca de cena, além de respeitar absolutamente o texto original.

As comparações foram muitas, como ilustra a gravura do alto desta página, que confronta os dois tipos físicos, de Garrick e Quin. Houve duelos pelas diatribes ideológicas entre os fãs dos dois. Qualquer semelhança com o nosso tempo não é mera coincidência.

*Mauricio Paroni de Castro é coordenador projeto “Chá e Cadernos”, na SP Escola de Teatro

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