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Enxergando o Medo com Outros Olhos

Publicado em: 07/09/2011 |

Carlos Henrique Oliveira, mais conhecido como Caique Torresmo, aprendiz de Humor do Módulo Amarelo da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco, escreveu um artigo para o site www.standupcomedy.com.br.
 

Leia abaixo este texto, no qual Caique fala, de maneira cômica, sobre a motivação pelo medo.

 

Pior que Barata, Melhor que Brigadeiro


Lembro que na infância, na época de colégio, todos dividiam seu lanche com os colegas. Não era questão de querer dividir, era questão de vida ou morte. Quem ousasse não repartir o lanche sofria bullying o resto do ano. Hoje em dia, sofrer bullying dá status, visibilidade em programas de TV e milhões de acesso no youtube. Mas, naquela época, só dava depressão mesmo.
 

Desde a infância, aprendemos a comprar amigos com atitudes “boazinhas”. Parece que uma venda foi colocada em nossa face para problemas de grande importância: fazer o que queremos fazer, falar o que queremos dizer, mijar onde queremos mijar (eu, por exemplo, adoro a tampa da privada).
 

Somos manipulados, desde cedo, a fazer o que não queremos por simples conveniência, por educação, por medo… Ah, o medo! Há muitas relações de “amor” baseadas no medo. Assim como muitos começam a fumar um “baseado” por medo de se sentirem excluídos. Medo! Medo de ir e isso provocar ira, medo de ficar e isso resultar em discussão, medo de ser feliz e isso causar inveja. Como diz Lenine, em uma de suas canções, “medo que dá medo do medo que dá”. Dia e noite acumulamos ações e gestos bondosos criados pelo medo. Distribuímos presentes por medo, e não por satisfação, por prazer, por querer dar algo a quem gostamos. Imagina não dar um presente para a amada no dia dos namorados? Você jamais faria isso e não é porque a ama muito, mas por medo da reação dela. Dar é doar ao outro sem pedir nada em troca, nada! Nem um sorriso, nem um olhar, nada. Somos escravos do “muito obrigado” por não saber presentear de verdade, de coração. Falta aumentarmos a potência do nosso “foda-se”, ele sim é a essência da felicidade.
 

Quem nunca ficou com alguém por medo de ficar sozinho, quem nunca ouviu um simples “eu te amo”? Antes de começar a chorar, caso nunca tenha ouvido isso de alguém, lembre-se que tem coisa pior. Sim, tem. Dizer “eu te amo” e escutar como resposta “obrigado por me amar, mas eu ainda não sinto o mesmo, porém saiba que eu gosto muito de você”. Sim, somos humanos, ouvir isso dói (preste atenção, eu usei o termo “isso dói” e não “isso deve doer”, mas tudo bem, já superei). A sinceridade às vezes dói mesmo, mas é uma dor que modifica, que constrói. Assisti a um filme, “O Vidente”, em que uma das personagens dizia “toda boa ação será castigada”. E, é por aí. Corremos risco ao sermos sinceros, honestos, pois isso não é comum. As pessoas não estão acostumadas a ouvir verdades, e quando ouvem, julgam que ela é um erro, uma infâmia (só pra usar uma palavra diferente no texto).
 

Por exemplo, se você quer comer seu surflair inteiro sem dividir com ninguém, não ofereça. Qual é o problema? A questão é: você não queria oferecer e não ofereceu. Com isso traiu sua consciência? Não. Então fim de papo. Não ofereça só porque aprendeu que é o certo, mas sim porque você quer dividir. Não traia a si mesmo, pois dormirá todos os dias com seu pior inimigo. E um dia ele te apunhala.
 

Muitos vivem com vendas nos olhos, enxergam o mundo a partir do que constroem em sua carente mente. É uma opção, porém lembre-se que toda venda é perecível. Um dia ela cai e você, como não foi acostumado a ver a realidade como ela é, pode não aguentar a pressão. Pelos dados que temos, 27 anos tem sido uma idade onde as vendas costumam putrefar. Aí é questão de escolha. Se você se aproxima dessa idade, cuidado! Pode ser agora ou nunca. Ter medo da realidade é normal, encará-la é um ato de coragem, fugir dela é cavar a própria cova e ter em sua lápide a sublime frase “Aqui jaz um covarde”. A vida não tem meio termo. Você faz comédia porque isso te dá vida, te satisfaz, ou por medo de ser considerada uma pessoa “comum”? Busca a fama porque você está preparado, ou por medo de ficar aquém dos outros que já a conseguiram? “Por medo você chupa a piroca do seu lado”, segundo Fábio Porchat no primeiro DVD do “Comédia em Pé”. E segundo Cláudio Torres Gonzaga, piroca não tem gosto de nada. Bom, a escolha é sua, viver uma vida “pirocada”, em preto e branco ou se arriscar. Será que você não tem nada sincero a dizer? Será que uma piada não tem nada a dizer? E lembre-se, ninguém gosta de comida sem sal, minha avó só come porque tem pressão alta.”