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Djunta Mon: Um sonho em movimento

Publicado em: 02/10/2017 |

Em Cabo Verde, a expressão em crioulo Djunta Mon tem uma grande importância social e cultural. Significando, literalmente, juntar as mãos, o conceito vai muito além disto e representa a capacidade que o cabo-verdiano tem de se superar graças ao espírito de entre-ajuda que tem sido apanágio deste povo crioulo, praticamente desde o início da sua fundação.

 

Por exemplo, na história da Cidade Velha, antiga Ribeira Grande, cidade da ilha de Santiago, registaram-se pelo menos 18 ataques de corsários de diferentes nacionalidades, justificados pela riqueza acumulada do tráfico negreiro, nos séculos XVI e XVII. Um dos casos mais “midiáticos” é o do pirata Francis Drake que, com uma força de cerca de mil homens, desembarca no outro lado da ilha. Durante a noite, percorre a distância que separa da Ribeira Grande, atacada na madrugada de 17 de Novembro. A população já abandonara a cidade e o saque não terá sido o que os corsários esperavam: por desforra, tudo rapinam, até os sinos das igrejas, e incendeiam Ribeira Grande.

 

Ora, muitas vezes, para sobreviver, todos tinham que se ajudar na fuga para as montanhas. Escravos, senhores feudais e até as autoridades coloniais. Alguns escravos aproveitavam para fugir e não mais voltar à cidade, mas o que prevalecia, apesar de tudo, era um espírito de entre-ajuda que nascia da consciência de que perante aquela ameaça exterior, ou se juntavam ou morriam todos.

Mais tarde, a ameaça veio das secas e da fome, que chegaram a dizimar, nalguns casos, um terço da população das ilhas. Novamente, a entre-ajuda entre familiares, amigos e até desconhecidos passou a ser condição de sobrevivência. E assim nascia a expressão crioula djunta mon. A união faz a força.

 

E foi graças a este espírito que nasceu no Mindelo, no passado dia 22 de janeiro, a Academia Livre de Artes Integradas do Mindelo (Alaim), que contou com uma militância, entre muitos outros, de Ivam Cabral, diretor da SP Escola de Teatro, na campanha desenvolvida no Brasil. Além desta, foi feita outra em Portugal e uma terceira em Cabo Verde. Empresários locais participaram com material e mão de obra. Artistas deram a cara. Algumas instituições apoiaram. E o sonho nasceu.

 

Um espaço que não tem trabalhadores, tem militantes. Não tem alunos, tem aprendizes. Um espaço que previligia o ensino artístico informal em liberdade, para crianças e jovens, num país que se diz cultural mas onde falta tudo: espaços de apresentação, escolas de formação, material técnico e didático e pessoal qualificado. O nascimento da ALAIM não vai mudar essa realidade, feita de dificuldades, vazios e urgências. Mas o que foi conseguido graças a um djunta mon como há muito não se via e sentia em Cabo Verde, mostrou que sonhar é bom e que esta expressão, nos dias de hoje, marcados por um individualismo exacerbado, continua a fazer sentido para o povo das ilhas.