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As Crianças de François Kahn

Publicado em: 27/08/2012 |

Sob a perspectiva fragmentada de uma personagem infantil, os aprendizes de Atuação do Módulo Amarelo abriram sua sala de trabalho na Sede Roosevelt da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco, na manhã do último sábado (25). Debruçados sobre o texto “Crianças na Rua Principal”, de Franz Kafka, e dirigidos por François Kahn, mostraram o resultado das duas semanas de aulas sob orientação do ator e dramaturgo francês.

Conforme disse Ivam Cabral, diretor executivo da Escola, quando Khan chegou à Instituição, “uma das principais qualidades do trabalho dele está em conseguir harmonizar, com perfeição, o físico com o texto”. E assim aconteceu. Dividindo a turma em dois grupos, Kahn trabalhou exercícios de memorização que se dividiam em uma “lição de casa” e atividades em sala de aula, que ligavam a sincronização física do corpo com a mente e, como o método para lembrar todo o texto foi reescrevê-lo diversas vezes, os aprendizes também tiveram de lidar com a impressão da palavra escrita contra a sensação da fala unida à ação, o que a aprendiz Bruna Paula de Moraes definiu, dizendo: “Foi um grande desafio e ia crescendo conforme nos familiarizávamos com o texto”. Cristiano Alfer, outro aprendiz que participou do trabalho, observou que “a ordem, a narração e o jogo físico, ao mesmo tempo, exigem muita concentração”.

Por meio de um sorteio no início de cada cena, Kahn acabou por não deixar que cada aprendiz tivesse falas fixas. Eles se baseavam na criança que quisessem e, com o texto na ponta da língua, pegavam as falas que eram sorteadas. Com a companhia de Verônica Veloso e Francisco Medeiros, Kahn quis mostrar, segundo suas próprias palavras, que “é possível trabalhar texto e ação separadamente e, depois, uni-los”. “Quis eliminar todos os ‘lugares comuns’ sobre crianças que os aprendizes pudessem ter. Dei liberdade aos atores e só fui moldando ao longo do trabalho”, explica.

 

Aprendizes do Módulo Amarelo em “Crianças na Rua Principal” (Foto: Hélio Dusk)

Para Lauanda Portela Varone, “o estado de atenção, tanto físico quanto mental, para a memorização do texto exigiram uma concentração maior e uma postura mais séria”, o que Nayara Tosin Rocha define como “a busca da simplicidade, do silêncio, da fuga do comum e da tentativa de dar a energia certa e pontual, a intenção de cada palavra”.

No geral, os métodos de memorização e a união do físico com o texto foram os pontos altos do trabalho, segundo os próprios aprendizes, e a participação de Khan em sua formação parece representar algo mais do que só mais um trabalho.

Da criança que cada um representou, porém, experiências também foram tiradas. Em uma conversa após a abertura de sala para o trabalho, cada aprendiz relatou suas sensações e uma discussão se abriu acerca do texto narrado fragmentadamente por uma personagem ainda criança, que contava sua história.

 

Nayara Tosin Rocha e Stella Maris Kraft Figueiredo (Foto: Hélio Dusk)

“Depois os pássaros ergueram voo como se fossem um chuvisco, eu os acompanhei com o olhar, vi como subiram num fôlego até não acreditar mais que eles subiam, mas sim que eu estava caindo e, segurando firme nas cordas, comecei a balançar um pouco, de fraqueza. Em breve balançava mais forte quando o sopro de ar ficou mais fresco e em lugar dos pássaros em voo apareceram as estrelas trêmulas”. (Trecho extraído do texto “Crianças na Rua Principal”, de Franz Kafka)
 

 

Texto: Gabriel Gilio