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Professora da USP escreve sobre experimentos cênicos do segundo semestre

Publicado em: 17/12/2018 |

Entre os dias 8 e 13 de dezembro, a SP Escola de Teatro realizou a Mostra de Experimentos Cênicos. Nela, os estudantes dos oito cursos regulares da Instituição apresentaram trabalhos que abordam o preconceito etário, tema discutido pedagogicamente durante o segundo semestre.

Alguns dos experimentos foram acompanhados por Andrea Lopes, professora de Gerontologia na Universidade de São Paulo (USP), e que, em setembro, conversou com os estudantes dos cursos regulares sobre o tema do semestre. Diferentemente dos artistas convidados pela Coordenação Pedagógica, que avaliam as questões artísticas ligadas aos experimentos, Andrea se ateve a fazer uma apreciação sobre eles quanto aos temas que foram discutidos em suas conversas com os estudantes.

A professora assistiu, especificamente, aos experimentos dos Núcleos 5, 6 e 8, apresentados na segunda-feira (10). “Confesso que me encolhi toda ao esperar a primeira apresentação. Fiquei quietinha rezando: ‘por favor, por favor, não reforcem clichês… não positivem mitos, não façam mais do mesmo!’. Confesso que nos últimos 25 anos estudando envelhecimento e velhice meus ouvidos foram demitidos. Não sinto mais muita vontade de ouvir o mesmo discurso riscado por mentes atônitas mediante suas próprias limitações. Felizmente, não foi o que experimentei”, escreveu em seu texto, que pode ser conferido na íntegra abaixo.

 

“Inicio agradecendo a oportunidade ímpar de conhecer a todos, tanto na palestra, quanto um pouco mais nas três apresentações que assisti. Obrigada, em especial, a Dione, por todo carinho, competência e apoio. Desculpo-me por não ter conseguido assistir a todas as apresentações. Curiosidade e interesse não me faltaram!

As considerações que faço, a seguir, portanto, são direcionadas as três apresentações que pude assistir. Como não sou artista, vou me ater tecnicamente às questões conceituais, de cunho gerontológico. Ressalto que observei o exercício dos conceitos em todas as dimensões teatrais que exploraram nas propostas. Aliás, como vocês são múltiplos!

Inicio dizendo do meu orgulho! Confesso que transbordou por todos os poros da Escola. O trajeto desse sentimento tão satisfatório foi desenhado pela minha emoção que batia aqui no peito sem tamanho, que me arrepiou a alma. Como vocês são competentes! Algumas cenas, em especial, me levaram à loucura do gozo pelas coisas belas, são elas:

Grupo N5: “Ahhhhh Marcelooooo”… esse ser imaginário que nos arranca dos medos, nos inebria de romance e nos faz fortes de sentido. Nessas doces e suaves cenas Shakespearianas, nascia significado e propósito, nascia desejo, germinava ação. A tanga rendada vermelha ensejou reflexões que passam por torturados e torturadores. O longo tempo Abramovic, imóvel, concentrado, esperando um público ansioso pelo primeiro espetáculo! Que resistência. Que indicação da imobilidade do estávamos prestes a revolucionar.

Grupo N6: a escolha do banheiro, conclamando o encontro com nossos mais íntimos, contraditórios e perversos pensamentos. Até que eles nos acolhem e nos engolem para o fosso sem fim do isolamento social. Belíssimo!!

Grupo N8: a entrada triunfal da matilha!!! WHAT??? Vi ali os mitos idadistas raivosos, nos devorando, nos ameaçando, nos mastigando como larvas. Não posso deixar de destacar a performance esplêndida do homem-rádio e do velho-boneco que fala, fala, fala e fazemos questão de nada entender! BRAVO!

Não posso deixar de saldar as bandas. Maravilhosas, todas! Igualmente, os cenários, os figurinos, a iluminação! Tudo em sintonia, bem ensaiado, harmonizado!

Ao final de cada apresentação, fiquem certos que queria abraçar com MUITA força a todos, saber detalhes da produção, saber os nomes, as motivações, saber o que mudou, indicar pequenos ajustes, agradecer olhando no olho todo empenho, toda confiança e toda seriedade com que receberam esse desafio tão fundamental para a convivência intergeracional.

Bem, vamos a outra parte… os conceitos gerontológicos.

Olhem, confesso que me encolhi toda ao esperar a primeira apresentação. Fiquei quietinha rezando: “por favor, por favor, não reforcem clichês… não positivem mitos, não façam mais do mesmo!”.

Confesso que nos últimos 25 anos estudando envelhecimento e velhice meus ouvidos foram demitidos. Não sinto mais muita vontade de ouvir o mesmo discurso riscado por mentes atônitas mediante suas próprias limitações.

Felizmente, não foi o que experimentei. No geral, as três apresentações foram impecáveis conceitualmente! Percebi que tive a felicidade de ver três apresentações que trataram de forma entrelaçada os grandes universos relacionais que a Gerontologia se debruça: A sociedade (N8), as instituições (N5) e as famílias e os indivíduos em sua imposta pequenez (N6). O idadismo foi refletido em todas as essas dimensões. Dois grupos de forma bastante explícita, concreta. Outro de forma poética.

Observei que se lambuzaram de toda a dimensão, extensão e intensidade de nosso encontro na mesa de debates que participei com o Sr. Isaías. Pude notar os temas, variáveis e conceitos: heterogeneidade versus homogeneidade, construção sociocultural, cultura, interdependência, intergeracionalidade, vulnerabilidade social, autonomia, independência, gestão gerontológica, infantilização da velhice, negação da velhice, profissionalização gerontológica, velhice como produto, morte, inovação, aparência, tempo, papéis sociais, gênero, renda, casamento, cuidado, produtividade versus inutividade, parentalidade, família, doença e saúde, cura e violência.

Quanta gratidão sinto por estar viva e presenciar tamanha competência. Nós demos tão pouco e vocês nos presentearam com a preciosa certeza que vale a pena continuar a trilhar nossos caminhos profissionais!

Nós do Programa de Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP esperamos vocês para uma rodada de apresentações e debates. Falo em meu nome, em nome do grupo que coordeno (EAPS) e em nome da nossa diretora, Profª Drª. Mônica Yassuda. CLARO, no mesmo dia já contei TUDO que vivi com vocês a ela!

Espero que todos vocês, sejam “jovens que chegarão no futuro”. Que não tenham medo da vida em movimento e que saibam usufruir da beleza que é construir uma sabedoria estratégica, que sabe manejar e harmonizar com dignidade a certeza das perdas e ganhos que constituem a natureza humana! Respeitar essa grandeza e potência trata-se do primeiro passo.

Abraço fraterno,
Profª. Andrea Lopes.




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