EN | ES

Papo de Teatro com Roberto Borges

Publicado em: 28/03/2011 |

Roberto Borges é ator

 

Como surgiu o seu amor pelo teatro?
Na sala de aula. Tive mestres que souberam me mostrar o quão divertido pode ser contar uma história pelo lado de dentro.

 

Lembra da primeira peça a que assistiu? Como foi?
A primeira peça que assisti foi a montagem de Gabriel Villela de “A Vida é Sonho” de Calderón de la Barca. Lembro-me que a atuação de Ileana Kwasinski me marcou bastante, experimentei uma sensação de epifania pela primeira vez.

 

Qual foi a última montagem que você viu?
“Tempo de Comédia”, no Teatro Cleyde Yáconis. A peça mostra de uma forma bem-humorada um estúdio onde os atores foram substituídos por andróides previamente programados. Será?

 

Um espetáculo que mudou o seu modo de ver o teatro.
“Apocalipse”, do Teatro da Vertigem, encenado numa antiga penitenciária. Durante uma peça do Vertigem, o limite entre o que é o público e o que são os atores, entre a realidade e a ficção, é muito tênue, te tira da zona de conforto. 

 

Um espetáculo que mudou a sua vida.
Podem ser dois? (risos) Vou citar dois bem diferentes: “My Fair Lady”, foi o primeiro grande musical que fiz e pude contracenar com grandes atores, como Francarlos Reis, e trabalhar com feras como Tânia Nardini e Jorge Takla. O outro foi “Travesties”, de Tom Stoppard, com direção de Caetano Vilela. Tive um prazer enorme em trabalhar um texto tão rico e dividir o palco com grandes atores mais uma vez, como Germano Melo, Fabiana Gugli, Rodrigo Lopez, Manoel Candeias, Roney Facchini, Patricia Dinely e Anette Naiman.  

 

Você teve algum padrinho no teatro? Se sim, quem?
Tive sim: Jorge Takla. Foi ele que acreditou primeiro em mim e me abriu as portas para o mundo do teatro musical e da ópera.

 

Já saiu no meio de um espetáculo? Por quê?
Nunca, não tenho coragem. É falta de respeito e de educação.

 

Teatro ou cinema? Por quê?
Os dois. Cada um emociona e provoca a reflexão à sua maneira.
 

 

Cite um espetáculo do qual você gostaria de ter participado. E por quê?
O Teatro tem alguns universos que gostaria de explorar. Quero muito ainda fazer um realismo americano, um Shakespeare e um musical do Kurt Weil e Bertold Brecht. Muita coisa, né?

 

Já assistiu mais de uma vez a um mesmo espetáculo? E por quê?
Já sim: “Apocalipse” e a ópera “Dido e Eneias”, montados pelo Teatro da Vertigem; “Cacilda”, do Teatro Oficina e alguns musicais, sou viciado.

 

Qual dramaturgo brasileiro você mais admira? E estrangeiro? Explique.
Conheço menos de dramaturgia do que gostaria, mas acho que posso citar sem medo Nelson Rodrigues e Brecht. O primeiro por traduzir a alma do brasileiro de uma maneira universal e completamente genial; e o segundo por revolucionar a maneira de se contar uma história, aproximando o teatro de questões socioeconômicas sem se esquecer de divertir a plateia.

 

Qual companhia brasileira você mais admira?
Teatro da Vertigem. Essa escolha não é racional. Depois que vi “Dido e Eneias”, montado pelo Antônio Araújo, fica difícil pensar diferente.
 

Existe um grupo ou companhia de teatro que você acompanhe todos os trabalhos?
Acompanho todos os musicais feitos pelo Charles Möeller e pelo Cláudio Botelho, eles entendem do gênero como poucos no Brasil. Sempre acompanho também o Teatro da Vertigem, o CPT e outros musicais.

 

Qual gênero teatral você mais aprecia?
Sou muito ligado ao teatro musical e à ópera. Emociono-me muito com peças do Arthur Miller e com o teatro épico do Brecht também.

 

Qual lugar da plateia você costuma sentar? Por quê? Qual o pior lugar em que você já se sentou em um teatro?
Sento onde der, mas, se puder, procuro escolher um lugar central, não muito longe dos atores, gosto de olhar no olho. Odeio frisas!

 

Fale sobre o melhor e o pior espaço teatral que você já foi ou já trabalhou?
O Teatro do Châtelet, em Paris, e o Teatro Amazonas, em Manaus, são dois lugares marcantes onde trabalhei, pela carga histórica. Acho que o banheiro do prédio das Artes Cênicas na USP não pode ser classificado exatamente como “espaço teatral”, mas a peça era incrível! (risos).

 

Já assistiu a alguma peça documentada em vídeo? O que acha do formato?
Sim, pude assistir a “Les Éphémères”, do Théâtre du Soleil, ao vivo e em vídeo. Acho que a peça perde bastante com a mudança do formato, você até consegue ver mais detalhes, mas o fato de respirar o mesmo ar dos atores é intransponível.

 

Existe peça ruim ou o encenador é que se equivocou?
Existe peça ruim sim e existe encenador ruim também, mas são coisas diferentes.  Um encenador bom consegue transformar em boa uma peça ruim e um encenador ruim pode transformar uma peça boa em ruim. Ainda não vi uma peça boa transformar em bom um encenador ruim.

 

Como seria, onde se passaria e com quem seria o espetáculo dos seus sonhos?
Dos sonhos? Seria um musical escrito pelo Stephen Sondheim, dirigido pelo José Henrique de Paula, com produção do Jorge Takla, coreografias de Tânia Nardini e luz de Caetano Vilela. Além de mim, no elenco, alguns amigos talentosíssimos.  

 

Cite um cenário surpreendente.
“Jekyll and Hyde – O Médico e o Monstro”, do J. C. Serroni, acho que surpreendente é a palavra.

 

Cite uma iluminação surpreendente.
A do Caetano Vilela em “Dueto para um”, que esteve em cartaz no Tucarena.

 

Cite um ator que surpreendeu suas expectativas.
Alguns: Otávio Martins em “Sideman”; Lee Taylor em “Senhora dos Afogados” ;  Germano Melo em “Travesties”; e Eduardo Leão em “Aqui do Lado”.

 

O que não é teatro?
Cinema, Internet, redes sociais são exemplos de coisas que não são teatro, mas podem virar!

 

Que texto você foi ler depois de ter assistido a sua encenação?
“A Vida é Cheia de Som e Fúria”, da Sutil Companhia de Teatro, baseado em “Alta Fidelidade”, do Nick Hornby.

 

A ideia de que tudo é válido na arte cabe no teatro?
Cabe. Se vai ter público é outra coisa.

 

Na era da tecnologia, qual é o futuro do teatro?
O futuro do teatro está no resgate do seu aspecto ritualístico.

 

O teatro é uma ação política? Por quê?
Sim, porque intervêm na vida das pessoas ou pelo menos se pretende a isso. Teatro é uma experiência que pode mudar a forma de enxergar o mundo, a cidade e, consequentemente, a política.

 

Quando a estética se destaca mais do que o texto e os atores?
Quando a história que está sendo contada ou a encenação não são fortes o suficiente para envolver o espectador.

 

Qual encenação lhe vem à memória agora? Alguma cena específica?
Na montagem parisiense de “A Noviça Rebelde”, dirigida por Emilio Sagi. Durante a cena do festival nazista, atores vestidos de soldados do Terceiro Reich entravam pela plateia como sentinelas. Muitos idosos que viveram a ocupação nazista em Paris durante a Segunda Guerra estavam presentes e não escondiam o mal-estar, alguns até saíam do teatro. Foi impressionante ver uma cena tão impactante em um espetáculo aparentemente “leve”.

 

Em sua biblioteca não podem faltar quais peças de teatro?
“Otelo”, “Hamlet”, “Os Fuzis da Sra. Carrar”, “A Morte do Caixeiro Viajante”, “Um Bonde Chamado Desejo”, “Pigmaleão”, “O Balcão” e “Seis Personagens à Procura de um Autor”, entre outras.

 

Cite um diretor (a), um autor (a) e um ator/atriz que você admira.
Tem muitos, mas vou escolher alguns do meu gênero preferido, o teatro musical: Harold Prince, Stephen Sondheim, Patti Lupone.

 

Qual o papel da sua vida?
Todos os que vivi e que vou viver ainda. Mas sonho em fazer o Iago do “Otelo”.

 

Uma pergunta para William Shakespeare, Nelson Rodrigues, Bertold Brecht ou algum outro autor ou personalidade teatral que você admire.
Minha pergunta vai para o Shakespeare: o que é estar pronto? É tudo? O que é tudo?

 

O teatro está vivo?
Enquanto houver vida, haverá teatro.