SP Escola de Teatro

Papo de Teatro com Fernanda Sanches

Fernanda Sanches é atriz 

Como surgiu o seu amor pelo teatro?
Desde criança, sempre quis ser atriz. Meu amor pela arte de atuar surgiu primeiro com os filmes e as novelas. Só mais tarde, na pré-adolescência, é que a paixão também começou pelo teatro. Mas me lembro da primeira peça teatral em que atuei, no jardim da infância: a música era “Aquarela”, de Toquinho, e eu era responsável por levantar a “astronave” no momento certo da música. Era tudo muito simples, mas tenho em minha memória até hoje a sensação de responsabilidade e alegria que “atuar” me dava naquele momento.

Lembra da primeira peça a que assistiu? 
Eu era criança ainda, tinha uns quatro anos, era um espetáculo infantil… Não me lembro exatamente qual, mas, segundo minha mãe, a primeira vez em que entrei num teatro eu não parava quieta. Ficava apontando para palco e dizendo o tempo todo: “Eu quero estar ali!”.

Um espetáculo que mudou a sua vida foi… 
Assistir a um espetáculo de Pina Bausch ao vivo, no Teatro Alfa, em São Paulo, foi um grande momento da minha vida. Eu já a conhecia por vídeos, fotos e livros e desde o primeiro momento que entrei em contato com a obra dela, foi muito especial. Descobrir esse limiar entre o teatro e a dança mudou meu modo de pensar a arte e, a partir daí, comecei a pensar que tipo de arte eu queria construir como intérprete e criadora. Cheguei até a fazer faculdade de dança, não para me tornar uma dançarina, mas para poder entrar em contato com meu corpo e tudo de expressivo que ele poderia me oferecer. Alguns outros artistas também foram muito importantes para essa minha mudança de perspectiva, como Kasuo Ohno e Tatsumi Hijikata, por exemplo.

Um espetáculo que mudou o seu modo de ver teatro foi…
São muitos, em diversos momentos da minha vida, mas o primeiro deles foi “Apocalipse, 1,11” do Teatro da Vertigem. Eu tinha 17 anos, era estudante de teatro em São Caetano do Sul, minha cidade, e mal conhecia o que acontecia de teatro fora do ABC. Quando me deparei com aquele espetáculo, encenado pelos corredores e celas do presídio desativado do Hipódromo, fiquei completamente comovida e virei fã do grupo. Consigo me lembrar de praticamente todas as cenas do espetáculo, de tão marcante que foi! Não só a encenação e o tema do espetáculo que me comoveram muito, mas também as grandes atuações de atores incríveis, como Mariana Lima, Luís Miranda, Sérgio Siviero…

Você teve algum padrinho no teatro? 
Não diria que tive “padrinho”, mas tive mestres incríveis durante minha carreira, que, com certeza, marcaram meu modo de olhar a arte. Entre eles, o José Renato, por exemplo, de quem eu já era fã como estudante e com quem tive o privilégio de trabalhar como atriz e assistente de direção, no próprio Teatro de Arena! Um dos meus mestres foi Alexandre Dressler, que foi meu professor de teatro dos 14 aos 19 anos e com quem eu entrei em contato com estudos fundamentais para minha carreira pela primeira vez, como: grandes dramaturgos mundiais e nacionais, mitologia grega e um trabalho de voz caprichado. Eu poderia considerá-lo meu padrinho, pois além de tudo o que ele me ensinou, fui vencedora do Prêmio Dressler de melhor atriz no ano em que me formei na Fundação das Artes em São Caetano do Sul, prêmio histórico de minha escola, do qual tenho muito orgulho!


Já saiu no meio de um espetáculo? 
Já… Porque era muito ruim, mas fiz todo o esforço para não ser notada…

Teatro ou cinema? 
Pergunta difícil… Como faço teatro há mais de 15 anos (comecei com 13 aninhos!) e tenho feito cinema nos últimos cinco anos, hoje em dia sinto um deslumbramento muito forte quando estou em um set. De fato, acho que meu trabalho como atriz é muito potente no cinema, pois tenho uma atuação que eu chamaria de mais minimalista. Gosto muito de atuar com sutilezas, que nem sempre são possíveis no teatro… Mas isso depende muito do tipo de trabalho em teatro que você faz. Agora, no meu primeiro solo, “A Cena”, que produzo e atuo, eu trabalho com uma limpeza de atuação que eu acredito que funcione muito no teatro – ou que pelo menos é uma coisa de que eu gosto muito. Não saberia escolher… Há algo mágico e ritualístico que acontece no palco, em nossa relação com o público, mas que também acontece no set quando o diretor diz: “Ação!”. O importante pra mim é atuar em trabalhos que eu acredite, esteticamente, ideologicamente. Pra mim, está aí a verdadeira magia e prazer de ser artista.


Cite um espetáculo do qual você gostaria de ter participado. E por quê? 
“Les Éphémeres”, do grupo francês Théâtre du Soleil. O tema do espetáculo me atrai muito: o universo da nossa vida “cotidiana”, que é cheio de pequenos milagres… E também porque o espetáculo trabalha com essa sutileza de atuação mais cinematográfica, sem perder a potência teatral, com uma qualidade impecável, que sempre existe nos trabalhos de Ariane Mnouchkine. Eu fiquei absolutamente impressionada com esse espetáculo. Era como ver cinema ao vivo!

Já assistiu mais de uma vez a um mesmo espetáculo? E por quê? 
Sim. Eu adoro ver o mesmo espetáculo mais de uma vez – quando é bom, é claro! Principalmente para acompanhar o processo da peça, que é um organismo vivo e vai mudando no decorrer das apresentações, e é muito interessante acompanhar essas mudanças… Já assisti a muitos por várias vezes seguidas, principalmente de atores e diretores amigos, onde existe a liberdade de trocar as sensações sobre o espetáculo e de dar meu feedback sobre o trabalho, que eu acho uma coisa maravilhosa e fundamental.

Qual dramaturgo brasileiro você mais admira? E estrangeiro?
Nossa, tem tantos! Bom, um dramaturgo brasileiro que acho genial é o Luís Alberto de Abreu. Acho a obra dele fantástica. Admiro muito também os novos dramaturgos que estão surgindo no momento, como Ricardo Inhan e Paloma Vidal, amigos e artistas maravilhosos. Estrangeiros… como citar só alguns sem parecer injusta? Ibsen, Shakespeare, Sófocles, Lorca são nomes cujas obras me marcaram profundamente, de corpo e alma. Dos mais atuais, gosto muito de Sam Shepard.

Qual companhia brasileira você mais admira?
Hoje em dia eu tenho gostado mais de trabalhos isolados de diversas companhias, ou mesmo de montagens que não pertencem a nenhuma…

Existe um artista ou grupo de teatro que você acompanhe todos os trabalhos?
Não, não há. Gosto de diversificar.

Qual gênero teatral você mais aprecia? 
Drama e Teatro Pós-Dramático.

Em qual lugar da plateia você gosta de sentar? Qual o pior lugar em que você já se sentou em um teatro?
Gosto de sentar no centro, bem de frente. Gosto de ver os atores de perto.

Existe peça ruim ou o encenador é que se equivocou? 
As duas coisas. Às vezes o texto que é ruim, a proposta é rasa, o encenador não sabe o que quer, os atores não estão envolvidos… Tudo isso faz um espetáculo ser ruim.

Como seria, onde se passaria e com quem seria o espetáculo dos seus sonhos? 
Eu adoraria fazer o espetáculo “Pouso”, texto de minha autoria, na beira do mar, onde as nuances da natureza e o ciclo do sol fariam parte da encenação…

Cite um cenário surpreendente.
O cenário do último espetáculo do Soleil: “Os Náufragos da Louca Esperança”, que é absolutamente surpreendente. Eu quase chorei quando entrei no teatro.

Cite uma iluminação surpreendente. 

A iluminação do Guilherme Bonfanti, para um espetáculo lindo do qual fiz parte, “O Que Eu Entendi do que o Tom Zé Disse”, no Mezanino do Sesi da Paulista, em 2005, era incrível. A luz atuava conosco, era parte viva do espetáculo.

Cite um ator que surpreendeu suas expectativas.
Quando assisti a Paulo Autran no teatro, em “Visitando Sr. Green”, fiquei impressionada. Não que eu já não soubesse que ele era incrível, mas vê-lo ao vivo foi inesquecível.

O que não é teatro? 

Gratuidade da proposta, tanto no sentido mais comercial ou mais “excêntrico” da palavra. Modismo. Encenação sem fundamento estético, texto preconceituoso, limitador.

A ideia de que tudo é válido na arte cabe no teatro? 
Eu acho que tudo vale, sim. Desde que esteja intrinsecamente ligado à sua visão de mundo como artista e cidadão.

Na era da tecnologia, qual é o futuro do teatro? 
Não sei mesmo… Só espero que os atores não sejam substituídos por robôs!

Em sua biblioteca, não podem faltar quais peças de teatro?
Nossa, muitas! “Casa de Bonecas”, “Édipo Rei”, “Hamlet”, “Sonho de uma Noite de Verão”, “A Casa de Bernarda Alba”, “Mente-Mentira”, “O Anel de Magalão”, “As Troianas”, “Quando as Máquinas Param”…

Cite um diretor (a), um autor (a) e um ator/atriz que você admira.
Mais uma pergunta difícil e injusta com tantos talentos no mundo! Mas vou citar artistas que pra mim vieram com uma estrelinha no bumbum:

Diretor: José Celso Martinez Corrêa; Autor: Shakespeare; Ator: Sean Pean; Atriz: Meryl Streep.

Qual o papel da sua vida?
Ah, adoraria fazer uma Blanche, Lady Macbeth, Fedra, Jocasta… Adoro personagens clássicas…

Uma pergunta para William Shakespeare, Nelson Rodrigues, Bertold Brecht ou algum outro autor ou personalidade teatral que você admire.
“Shakespeare, você acredita que talento é algo inato ou se constrói?”

O teatro está vivo?
Sim, sempre! Evoé!

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