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Papo com Paroni | Ibsen nunca mais foi o mesmo

Publicado em: 02/06/2014 |

* por Mauricio Paroni de Castro, especial para o portal da SP Escola de Teatro

 

Em 1981, ao trabalhar no Festival Internacional de Teatro organizado por Ruth Escobar (sempre ela, a pular a cerca do autoisolamento da condição continental da cultura brasileira), fui fulgurado pelo trabalho do americano off-off-Broadway Lee Breuer e seu Mabou Mines (*). Era o inesquecível “Prelude to a death in Venice”. Breuer  manejava um boneco de ventríloquo. Esperei alguma coisa direta do romance de Thomas Mann. Foi assim, de certo modo, mas a matéria era um vertiginoso jogo de palavras cínico, critico, crível e paradoxal; partia de um improvável “conceito Costa Oeste”, referente a uma Venice Beach, na Califórnia, inundada de algas, que evocava a existência – ou não – de um lugar ao Sol para o João Ninguém contemporâneo. Em uma composição  orgânica de teatro de marionetes e cinema, era uma paixão mitológica entre a natureza e o homem ocidental, revitalizada pela citação do icônico Tristão e Isolda.

 

***

 

Muitos anos depois, vi o que considero uma obra-prima da ironia no teatro: “Casa de bonecas” encenada com anões. Exceções eram Nora, atriz loiraça Hollywood style, e seus filhos, da mesma estatura dos anões. Estes eram os outros burgueses. Figurino de época impecavelmente burguês. A chave era o contexto da realidade física daqueles atores e a cenografia: uma casa de bonecas verdadeira, de criança, onde Nora era mantida cinicamente abaixada, ou de joelhos. A ideia de criancismo aqui é onipresente.

 

“Casa de bonecas”

 

A metáfora, a integração entre ficção e realidade, a estética das escolhas e a organicidade do todo são o que de mais definitivo vi num espetáculo de Ibsen. O seu realismo foi respeitado ao máximo; mas paradoxalmente desconstruído até a demolição final do sonho burguês.

 

Ibsen nunca mais foi o mesmo.

 

Ver aqui: http://www.youtube.com/watch?v=K8yVqifRCwE

 

(*) Para se ter uma ideia do que é Mabou Mines, reza o programa do grupo que:

 

“O propósito artístico de Mabou Mines continua a ser a criação de novas peças de teatro com textos originais a partir do uso teatral de textos preexistentes(…). Cada membro é encorajado a perseguir sua visão artística, iniciando e colaborar em uma ampla gama de projetos de estilos variados, desenvolvendo-os desde o conceito inicial para o desempenho final. Este procedimento é intenso e muitas vezes demorado. Enquanto o diretor de um trabalho é responsável pelo seu conceito e sua estrutura básica, a produção final reflete as preocupações e formas artísticas de todos os seus colaboradores “. (Do site do grupo).

 

Em 2005, qual instituição de serviço social, recebeu parte de uma doação de US$ 20 milhões do Carnegie Corporation, possível graças a uma doação pelo prefeito de Nova York Michael Bloomberg.

 

O Mabou Mines reimagina peças clássicas multidisciplinarmente, colaborações tecnológicas entre os seus membros, compositores, escritores, músicos, bonequeiros e artistas visuais contemporâneos. Explora os mais recentes conceitos de música, artes visuais, tecnologia e animação com as formas tradicionais de expressão criativa: marionetes, texto escrito, movimento, cenografia. Utiliza vários idiomas, refaz obras clássicas com artistas não tradicionais, colabora com artistas com deficiência física e mental, e ajuda artistas e populações marginalizadas a conectarem-se através de mais de 250 artistas associados ao redor do globo. Entre seus diretores artísticos estiveram  Ruth Maleczech, Lee Breuer, JoAnne Akalaitis, Philip Glass, Fred Neumann e David Warrilow.

 

Para sair da memória que se tem de um grupo com tal passado: farão, em 2015, no La Mama Studio de nova York, “Imaginar o doente imaginário” – oficina de Performances utilizando “O doente imaginário”, de Molière, “União dos hipócritas”, uma brincadeira de Bulgakov com Molière, além de alguns textos históricos originais sobre medicina e política.

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