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Emilio Di Biasi por Hugo Possolo

Publicado em: 28/03/2012 |

Caminhos de artistas se cruzam muito, mas nem sempre podemos conviver com grandes mestres e absorver o que eles têm a oferecer. Tive sorte. Emílio Di Biasi fez 50 anos de carreira e, nesta semana, gostaria de homenageá-lo com a mesma singeleza e simplicidade com que ele levou todo o seu trabalho vida adentro.

 

Conheci Emílio quando ele era presidente da Apetesp. Eu tinha, aos 17 anos, acabado de abrir a minha “firma”, uma produtora de teatro, e já queria estar filiado à associação dos produtores. Depois da ajuda de um amigo, um produtor experiente, o Toninho Mathias, lá estava eu sentado diante de um ator que eu vi tantas vezes no teatro, no cinema e na televisão.

 

Além disso, filiar-me à Apetesp era importante para participar de editais, em especial nos que solicitavam teatros públicos, o que permitiria montar minhas primeiras peças.

 

Aquele encontro me deu um medo, me fez tremer. Emílio fazia aquilo que eu sonhava para minha vida toda: ser ator. E eu, moleque de tudo, afirmando que queria produzir peças e atuar? Era muita pretensão! O momento era tenso.

 

O Emílio olhou para o Toninho e perguntou:

 

– Ele é dos nossos?

 

E eu, assustado:

 

– Como assim?

 

– Você é do teatro?

 

– Quero ser de teatro!

 

– Então, está certo. Pode fazer a ficha de filiação dele.

 

E me dispensou. Demorei a entender aquela tão rápida conversa. 

 

Toninho, depois, me explicou que Emílio sempre fazia esta pergunta e que a maioria das respostas eram explicações vagas sobre a televisão, ao que ele sempre respondia que a Apetesp era de teatro e não de televisão. Como eu não compreendi e afirmei que “queria ser de teatro”, aquilo cativou o Emílio, que não esticou a conversa, aprovando minha empresa de cara.

 

Muitos anos depois disso, foi uma enorme realização pessoal poder trabalhar com Emilio Di Biasi, ator que sempre admirei e que dirigiu um dos mais importantes trabalhos dos Parlapatões.

 

Quando combinamos fazer “[email protected]”, texto que ele trouxe para nós, a preocupação comum era conciliar sua vertente de interpretação, baseada em Stanislavski, e nossa linha de trabalho de representação aberta, mais ligada ao circo e à Meyerhold. Poderia ser um choque, que afetaria a peça de maneira desastrosa. Mas, nosso diálogo claro sobre como proceder provou o contrário.

 

A maior preocupação do Emilio como diretor é, exatamente, com a manifestação plena do intérprete, que o ator esteja inteiro em cena, a serviço da dramaturgia para emocionar o público. Ele crê que o riso é, também, emoção e não o restringe a uma compreensão apenas intelectual, mas também sensorial do humor. Para nós, dos Parlapatões, ele quebrou um paradigma e abriu possibilidades de encenação que marcaram nossa trajetória.

 

No fundo, o que o Emilio oferece aos atores que dirige são os caminhos que trilhou como intérprete, de ir fundo em todos as nuances que uma personagem permitir, buscando um domínio da atuação.

 

Sua preocupação sempre foi com que outras gerações compreendessem a dimensão e importância de se viver uma personagem, coisa que tem ficado cada vez mais rara nos palcos. As personas em cena, hoje, são um misto de construções arquetípicas – quando boas – e, por vezes, estereotipadas – infelizmente na maioria dos casos –, para somar-se a um culto ególatra e de imagens públicas pré-fabricadas pela mídia, que visam única e exclusivamente movimentar o dinheiro, nunca a profundidade da alma humana.

 

Atuar é, sobretudo, a essência do teatro. E Emilio é um ator essencial do teatro brasileiro. Sei que seus ensinamentos me permitem repetir o que aprendi nos primeiros segundos de contato com ele: “quero ser de teatro!…”, como Emilio sempre foi e será!

 

 

Veja o verbete de Hugo Possolo e Emilio Di Biasi na Teatropédia.

 

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