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A Arte do Foley no Curso de Sonoplastia

Publicado em: 07/06/2013 |

Por Martin Eikmeier*, especial para o portal da Escola

 

 

Neste primeiro semestre de 2013 os aprendizes do curso de Sonoplastia da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco investigaram a prática do foley no componente de práticas sonoras. A arte do foley consiste na composição de sons para objetos, em que o som original, aquele que o objeto produz no cotidiano, mostra-se insuficiente ou inadequado para uma determinada situação cênica. Em alguns casos trata-se de objetos que existem apenas no mundo ficcional, como é o caso  dos filmes de ficção científica, que muitas vezes demandam um universo sonoro inédito e complexo. Existem ainda situações nas quais um objeto não possui um som associado na realidade, mas quando é introduzido em uma cena ficcional, um som se torna indispensável.

 

Diante de uma tarefa de tal natureza é fundamental ativar a imaginação e, mais do que isso, saber conduzir a imaginação de forma precisa para o objetivo proposto. Para tanto, uma série de perguntas-chave acerca do objeto servem de instrumento para criar caminhos para uma criação consciente. É importante, portanto, compreender as características que podem definir um som e equipar-se de um vocabulário que dê conta de nomear tais características: esse som é constituído por uma única camada ou mais de uma? Ele é forte ou fraco, tem muito ou pouco ataque, é grave ou agudo, é áspero ou liso, úmido ou seco? Qual o ponto de escuta desse som? Ouvimos de perto ou de longe; ouvimos mais som refletido ou mais som direto?

 

Uma das tarefas dadas aos aprendizes, foi a realização do som de uma lesma andando. A lesma é um animal que produz um som, porém muito baixo e difícil de captar. Dessa forma, a solução de imaginar ruídos que o animal faria e criá-los em estúdio se mostra mais fácil e eficiente, já que pode ser rigorosamente controlada. A primeira etapa do trabalho foi responder à pergunta: que camadas de som esse animal, ao andar pode produzir? 

 

1 – o som do corpo deslizando sobre a superfície (que superfície é essa?)

2 – o som do próprio corpo se contorcendo 

3 – o som dos fluídos que a lesma produz e que a torna um animal com aspecto úmido e melecado.

 

Para esse exercício, a aprendiz Pammela Pinheiro utilizou sabão, esponja, água e um balde. O som do corpo deslizando sobre a superfície foi produzido pela aprendiz a partir da manipulação e do atrito dos dedos na esponja. Para o som do corpo se contorcendo, ela torceu essa mesma esponja com pouca umidade. E por fim, para o som dos fluídos produzidos pelo animal, a aprendiz ensaboou a própria mão esfregando uma na outra com um balde embaixo para reter os respingos. A aprendiz tomou o cuidado para ficar a uma distância curta da água que estava dentro do balde, de modo que os respingos não produzissem um som com ataque muito forte e que um gotejamento não fosse reconhecível.   

 

Além de se fazer as perguntas mais apropriadas e estar aberto a experimentar, o aprendiz deve ter o domínio dos equipamentos que têm à sua disposição de modo a escolher o mais adequado para a situação. No caso da situação descrita acima, os sons que iriam ser gravados apresentavam baixa intensidade o que favorece uma relação ruim entre o sinal gravado e os ruídos internos que um equipamento naturalmente produz. Para tanto, foram escolhidos dois microfones com a menor relação entre sinal e ruído dentre os que estavam disponíveis na escola. Ao final da gravação ouvimos um e outro para poder optar por aquele que melhor atendia ao propósito. 

 

Embora o exercício tenha sido feito em sala de aula e não em um estúdio com a quantidade de silêncio necessária para gravar um som dessa qualidade, ele se mostrou fundamental para a finalidade pedagógica a que se propunha.  Permitiu uma produtiva discussão de como trabalhar a criatividade no limite entre a intuição e a consciência. Além disso possibilitou a demonstração do uso de equipamentos para as mais variadas demandas e nas mais diversas condições. 

 

Outros sons sugeridos para o exercício foram: a explosão de uma bomba com estilhaços, o som do Sol a partir de um ponto de escuta próximo, o som de um estômago do ponto de escuta de dentro do mesmo e o som de uma tempestade do ponto de escuta de quem está dentro de uma casa.   

 

 

 

* Martin Eikmeier é músico, compositor, pesquisador e formador do curso de Sonoplastia da SP Escola de Teatro